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Renato da Fonseca, economista-chefe da CNI, explica que, nos últimos anos, a estrutura industrial intensificou um mo- vimento em direção a setores produto- res de bens de consumo semiduráveis ou não duráveis, típicos do início do proces- so de industrialização. A participação des- ses setores tradicionais passou de 25,6% para 35% entre os biênios de 2007/2008 e 2017/2018, e a presença de setores que produzem bens intermediários caiu de 49,3% para 44,4% no mesmo período. A CNI avaliou as mudanças entre 2008 e 2018 com base no último dado da Pesquisa In- dustrial Anual (PIA) do IBGE. O resultado desse processo, segundo Fonseca, é que o Brasil tem uma das mais baixas participações de setores intensivos em tecnologia e inovação na comparação com países da OCDE: ocupa a 23ª posição entre 28 países. A indústria brasileira se tornou menos diversificada, mas o prin- cipal problema para a economia brasilei- ra é o fato de que esse movimento ocorreu no sentido de setores mais tradicionais. “Esse grupo, em geral, produz bens de me- nor intensidade tecnológica. A exceção é o setor de farmoquímicos e farmacêuti- cos, que aparece no grupo por produzir majoritariamente bens não duráveis”, ex- plica o economista-chefe da CNI. CADEIRAS DE VALORES Especialista na indústria farmoquímica e farmacêutica, a economista Lia Hasencle- ver, da Universidade Federal do Rio de Ja- neiro (UFRJ), diz que o mundo vem passan- do por um processo de reorganização da divisão internacional do trabalho a partir da aceleração das tecnologias de informa- ção e comunicação, o que também contri- buiu para o processo de desindustrialização no Brasil. “Nós não estamos sendo integra- dos nas cadeias de valores das multinacio- nais”, afirma. Isso não aconteceu, segundo ela, porque faltou fortalecimento produti- vo e tecnológico do país. Ainda de acordo com o estudo, entre os setores que produzem majoritariamen- te bens intermediários, os de química, de papel e celulose e de produtos de borracha e plástico aumentaram a participação no PIB industrial nos últimos 10 anos. Já os setores de metalurgia, de coque, derivados do petróleo e biocombustíveis, de produ- tos de metal e produtos de minerais não- -metálicos e de madeira perderam parti- cipação e cresceram abaixo da média da indústria de transformação. O setor de metalurgia, que passou da quarta para a quinta posição, registrou queda de 9,96% para 6,67% no mesmo período. João Emílio Gonçalves, superintenden- te de desenvolvimento industrial da CNI, explica que a estrutura industrial do Brasil tem a vantagem de ser mais diversificada que a média dos países da OCDE, o que é importante, pois a diversificação setorial reduz a vulnerabilidade das economias ao evitar a dependência de poucos setores. No entanto, o fato de a participação dos se- tores de alta complexidade ser pequena é um problema. Conforme o estudo da CNI, a participação de setores de bens de capi- tal e bens de consumo duráveis no Brasil é uma das mais baixas quando comparada à dos 27 países-membros da OCDE. Entre 2008 e 2018, os fabricantes de bens tradicionais, como alimentos e be- bidas, que são menos complexos e me- nos intensivos em inovações, ampliaram sua fatia de 25,6% para 35%. Bens inter- mediários, como madeira e produtos de minerais não-metálicos, também perde- ram participação, de 49,3% para 44,4%. “É como se a indústria estivesse andando para trás em termos de composição”, afir- ma Fonseca, da CNI. Apesar de elevado em relação a vários outros países, o grau de diversificação da indústria brasileira vem diminuindo e se concentrando no setor de bens não duráveis e semiduráveis. O estudo, afirma Gonçalves, mostra da- dos que já foram observados por outros in- dicadores. “Quando a gente vê a composi- ção da pauta de exportação brasileira, isso já estava claro: queda da participação de bens com maior intensidade tecnológica”. Segundo ele, é preciso uma política indus- trial que foque na inovação e diversifica- ção. “Isso é o que os outros países fazem. Os países desenvolvidos têm o ambiente competitivo e a política industrial para es- timular a modernização, novas atividades e avanço na indústria 4.0. É disso que nós precisamos”, resume. Rafael Cagnin, economista do Institu- to de Estudos para o Desenvolvimento In- dustrial (Iedi), chama atenção ainda para o Custo Brasil, que reduz a competitivi- dade dos produtos brasileiros. “É verda- de que esse custo afeta todas as ativida- des produtivas do país. O problema é que a indústria tem cadeias mais longas e essas distorções se acumulam”, avalia. Segundo ele, o Brasil não conta com instrumentos adequados de investimento em inovação, fundamentais para o desenvolvimento in- dustrial. Outro fator transversal, explica ele, é o relativo isolamento brasileiro na economia mundial. ■ Fonte: Elaborado pela CNI, com base em dados da Pesquisa Industrial Anual – PIA do IBGE. Nota: As participações foram calculadas a partir dos valores médios nos períodos 2007-2008 e 2017-2018. *Corresponde à divisão 33 “Manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos” da CNAE 2.0. Estrutura da produção da indústria de transformação brasileira Cai participação de bens intermediários na cadeia produtiva industrial Tradicionais (bens não-duráveis e semiduráveis) 2007-2008 Tipo do bem 2017-2018 Bens intermediários Bens de consumo duráveis e de capital Não classificados* 25,6% 35,0% 49,3% 44,4% 23,8% 18,7% 1,3% 1,9% ▶ O economista Paulo Morceiro lembra que os setores que estão perdendo espaço são justamente os que pagam salários acima da média da economia 28 29 Revista Indústria Brasileira ▶ julho 2021 Revista Indústria Brasileira ▼ Competitividade

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